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O velho caso do Airbnb em prédios residenciais

Não é de hoje que testemunhamos discussões acaloradas nas assembleias condominiais sobre a legalidade da prática de locação de curta temporada, na tão famigerada modalidade praticada nas plataformas digitais como o “AIRBNB” e plataformas similares.

Existem aqueles que defendem veementemente o direito de propriedade acima de eventual interesse da coletividade, e os demais, que sustentam que locar a unidade condominial por curtos períodos para diversas pessoas em um pequeno intervalo de tempo, caracteriza uma prática comercial, desvirtuando a finalidade exclusivamente residencial dos condomínios.

E no mundo jurídico também não é diferente. O tema é polêmico, objeto de frequentes discussões no judiciário, e retorna à tona com o julgamento do Recurso Especial nº 1884483/PR, iniciado na última terça feira pela 3ª Turma de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Esta é a primeira oportunidade em que a 3ª Turma irá debater e decidir sobre o tema. O caso específico que os ministros irão julgar foi proposto por um proprietário, que utiliza frequentemente a plataforma “AIRBNB” para locar sua unidade condominial, e busca a anulação de uma decisão assemblear de seu condomínio que proibiu as locações por períodos inferiores a 90 (noventa) dias.

O relator do caso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, destacou em seu voto a incompatibilidade da prática em condomínios residenciais, onde a vontade coletiva é a que deve prevalecer sobre os anseios individuais dos condôminos.

“Tem-se um contrato atípico de hospedagem, expressando uma nova modalidade, singela e inovadora, de hospedagem de pessoas sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas”
(…).
“A exploração econômica de unidades autônomas mediante locação em curto ou curtíssimo prazo, caracterizada pela eventualidade e transitoriedade, não se compatibiliza com a destinação exclusivamente residencial. É inegável a afetação do sossego, da salubridade e da segurança causada pela alta rotatividade de pessoas estranhas e sem compromisso duradouro com a comunidade na qual está, temporariamente, inserida”
(…).
“Sendo a destinação residencial prevista em convenção condominial requisito suficiente para obstar a prática em questão, torna-se inócua a discussão sobre a eventual existência de vícios na assembleia na qual foi aprovada a proposta de proibir a locação de unidades autônomas pelo prazo inferior a 90 dias”

Por hora, o julgamento da terceira turma segue suspenso, e sem previsão de retorno, em razão dos pedidos de vista realizados pelos ministros Moura Ribeiro e Marco Bellizze.

Importante relembrarmos que o assunto já foi pauta de julgamento da 4ª Turma de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça em maio do presente ano, quando do julgamento do Recurso Especial n º 1819075/RS.

Naquela oportunidade, por maioria dos votos, os ministros decidiram, naquele caso específico, pela impossibilidade de uso da plataforma “AIRBNB” no condomínio, tendo em vista a previsão em convenção de uso estritamente residencial das unidades autônomas, salvo no caso de os próprios condôminos alterarem a convenção para prever a possibilidade do uso da plataforma, de maneira expressa.

A esse despeito, vale acrescentar que a alteração da convenção neste aspecto e via de regra se dará por meio de deliberação em assembleia com quórum qualificado.

Em seu voto, o Ministro Raul Araújo proferiu:

 

“Tem-se um contrato atípico de hospedagem, expressando uma nova modalidade, singela e inovadora, de hospedagem de pessoas sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas. ”
(…).
Assim, o direito do proprietário condômino de usar, gozar e dispor livremente do seu bem imóvel, nos termos dos artigos 1.228 e 1.335 do Código Civil de 2002 e 19 da Lei 4.591/1964, deve harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas propriedades abrangidas no condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em regime de condomínio edilício. “

Cabe aqui pontuar que nenhum dos julgamentos acima mencionados possui repercussão geral, isto é, não obrigam que outros casos semelhantes sigam o mesmo entendimento. Todavia, abrem um grande precedente para que os tribunais inferiores sigam a mesma linha de raciocínio nos julgamentos.

As discussões sobre a legalidade da prática de utilização de aplicativos do tipo “airbnb” em condomínios devem se perpetuar por um longo período nos tribunais, enquanto não ocorrer uma uniformização do entendimento do judiciário e consequente regulamentação pelo Poder Legislativo.

Opinião Legal

Inicialmente, cumpre aqui explicar o funcionamento da plataforma AIRBNB e similares.

Em síntese, alguns moradores oferecem suas unidades condominiais para hospedagem de terceiros, por curtos ou curtíssimos períodos, usando-se de aplicativos (AIRBNB, por exemplo) para a realização dos negócios, em clara contratação para fins de hospedagem. Algumas dessas hospedagens são realizadas para apenas alguns dias, por vezes apenas uma única diária no imóvel locado.

Nestes casos, é franqueada a entrada no condomínio de diversas pessoas estranhas àquela comunidade condominial, em alta rotatividade, e na maioria esmagadora dos casos, as regras condominiais não são observadas por estes indivíduos, que se utilizam das áreas comuns sem qualquer cuidado para não ferir o direito dos reais condôminos.

A celeuma travada na questão se refere exatamente sobre o tipo de contrato operado por meio da plataforma; usuários e a própria AIRBNB alegam que seus negócios são típicos contratos de locação, regidos pela Lei do Inquilinato; os condomínios, por sua vez, apontam que a plataforma opera contratos típicos de hospedagem.

De proêmio, necessário apontar que, diferentemente do que alegam os que defendem o uso indiscriminado da plataforma e sua utilização em condomínios residenciais, o controle de seus hóspedes, sobretudo no que diz respeito ao estrito cumprimento da convenção do condomínio e também do regulamento interno, é fraco e de baixo espectro, de maneira que diversos dissabores são observados nestas situações.

Além da impossibilidade e dificuldade em compelir os hóspedes a seguirem as regras condominiais, existe ainda a quebra de questão primordial que, muitas das vezes, é o fiel da balança na hora de se optar por um imóvel localizado em condomínio residencial: a segurança.

Sem contar com o próprio animus em si de viver no local com a expectativa de continuidade, estabelecendo vínculos com a comunidade, o que não ocorre nas locações em exame.

Ainda que as plataformas digitais esclareçam em seus sites que a primazia do serviço é pela segurança, as próprias reconhecem a dificuldade em identificar os sujeitos cadastrados na plataforma, se eximindo de quaisquer responsabilidades. Referido tema se encontra na cláusula 1.3 dos Termos de Serviço do AIRBNB:

“1.3 Embora possamos ajudar a facilitar a resolução de disputas, a Airbnb não tem qualquer controle sobre e não garante (i) a existência, qualidade, segurança, sustentabilidade ou licitude de qualquer Anúncio ou Serviços de Anfitrião, (ii) a veracidade e a precisão de quaisquer descrições de Anúncio, Avaliações, Comentários, ou outros Conteúdos de um Membro (conforme definido abaixo), ou (iii) o desempenho ou a conduta de qualquer Membro ou terceiro. A Airbnb não endossa qualquer Membro, Anúncio ou Serviços de Anfitrião. Quaisquer referências a um Membro sendo “verificado” (ou linguagem similar) apenas indica que o Membro completou um processo de verificação relevante, e nada a mais. Nenhuma dessas descrições significa endosso, certificação ou garantia fornecidos pela Airbnb sobre o Membro, inclusive sobre a identidade ou o histórico do Membro ou se o Membro é confiável, seguro ou adequado. (…)”

Ainda com todas as ferramentas que a AIRBNB possui para registrar os usuários, a própria empresa reconhece que tais informações podem não condizer com a realidade, eximindo-se de qualquer responsabilidade decorrente dessa ausência de apuro nas informações repassadas pelos usuários.

É notório que a AIRBNB é, sim, um serviço de hospedagem. Isto fica ainda mais claro nos Termos de Serviço da plataforma, senão vejamos:

“1.1 A Plataforma Airbnb é um mercado on-line que permite aos usuários cadastrados (“Membros”), e terceiros determinados, que oferecem serviços (Membros e terceiros que oferecem serviços são chamados de “Anfitriões” e os serviços que eles prestam são “Serviços de Anfitrião”) anunciar esses Serviços de Anfitrião na Plataforma Airbnb (“Anúncios”) e comunicar-se e fazer transações diretas com membros que estejam buscando reservas como Serviços de Anfitrião (os Membros que utilizam os Serviços de Anfitrião são chamados de “Hóspedes”). Os Serviços de Anfitrião podem incluir a oferta de propriedades destinadas a férias ou outros usos (“Acomodações”), atividades de um ou de múltiplos dias em diversas categorias (“Experiências”), acesso a eventos e locais únicos (“Eventos”), e diversos outros serviços relacionados ou não à viagem. ” (g.n.)

Salta aos olhos que a própria plataforma reconheça que membros que tomam os serviços oferecidos pelos Anfitriões são chamados de Hóspedes.

Ora, para fins argumentativos, se fosse o caso de a plataforma oferecer um mercado online de locações por temporada, conforme se alega, por qual razão então nomeia seus membros como anfitrião e hóspede e não como locatário e locador? A resposta não poderia ser outra a não ser aquela que aponta que o serviço oferecido não se trata de nenhuma das modalidades previstas na Lei do Inquilinato (Lei 8.245/91).

Pode-se ainda apontar, como exemplo para demonstrar o que as plataformas como a AIRBNB oferecem, que a relação jurídica mantida entre esta e seus membros é de consumo e, portanto, deve ser pautada pelo Código de Defesa do Consumidor. Tal característica se nota pela forma como a AIRBNB nomeia o que ali se comercializa (e os serviços que eles prestam são “Serviços de Anfitrião”). Já as locações, sejam residenciais, comerciais, por temporada ou não, possuem regramento próprio e não admitem a aplicação do CDC. Isso demonstra que os membros do AIRBNB não possuem ao seu dispor nenhum dos procedimentos previstos no Título II da Lei do Inquilinato, como despejo por falta de pagamento e/ou revisional de aluguel.

E assim, em razão da finalidade estritamente residencial da ampla maioria dos condomínios onde esta ferramenta é utilizada, se defende que condomínios estritamente residenciais não comportariam o uso da plataforma por seus proprietários. Ocorrendo, na prática, um verdadeiro desvirtuamento da finalidade do edifício.

Outrossim, deve ser pontuado que, em se tratando de condomínio, a vontade coletiva é a que deve prevalecer sobre os anseios individuais dos condôminos. E assim sendo, as convenções condominiais traduzem a vontade da ampla maioria dos condôminos, que pretendem verem resguardados o sossego, a salubridade e, acima de tudo, a segurança dentro do condomínio.

E da ideia de primazia da vontade coletiva que emana o princípio constitucional da solidariedade, expresso no art. 3º, I da Carta Magna como um dos objetivos fundamentais da República.

Alexandre de Moraes assim leciona:

 

“Por fim, modernamente, protege-se, constitucionalmente, como direitos de terceira geração os chamados direitos de solidariedade ou fraternidade, que englobam o direito a um meio ambiente equilibrado, uma saudável qualidade de vida, ao progresso, à paz, à autodeterminação dos povos e a outros direitos difusos, que são, no dizer de José Marcelo Vigliar, os interesses de grupos menos determinados de pessoas, sendo que entre elas não há vínculo jurídico ou fático muito preciso. Como conclui Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “a primeira geração seria a dos direitos de liberdade, a segunda, dos direitos de igualdade, a terceira, assim, complementaria o lema da Revolução Francesa: liberdade, igualdade, fraternidade”. Note-se que Celso Lafer classifica esses mesmos direitos em quatro gerações, dizendo que os direitos de terceira e quarta gerações transcendem a esfera dos indivíduos considerados em sua expressão singular e recaindo, exclusivamente, nos grupos primários e nas grandes formações sociais.1

Ou seja, deixar prevalecer os interesses de poucos usuários da plataforma, mesmo que a convenção do condomínio preveja o uso estritamente residencial, que emana a vontade coletiva, é ferir preceito constitucional que é um dos pilares republicanos.

Aliás, vale frisar que o direito de propriedade, conforme entendimento majoritário da jurisprudência dos Tribunais e também da doutrina, não mais pode ser considerado como ilimitado, ainda mais em se tratando de propriedade inserida em condomínio edilício:

“Agravo de Instrumento. Condomínio. Tutela de Urgência de Natureza Antecedente. Pretensão a que possa livremente locar seus imóveis por temporada e mediante uso de aplicativos, bem como para que seja afastada a restrição de uso das áreas comuns pelos inquilinos. Locação por uso de aplicativos ou páginas eletrônicas (‘Airbnb’ e afins) que possui finalidade característica de hotelaria ou hospedaria. Deliberações tomadas em Assembleia Geral Extraordinária, por medidas de segurança aos condôminos”. (TJSP, Agravo de Instrumento 2013529-28.2018.8.26.0000, Rel. Bonilha Filho, j. 26.02.2018) ”

“Agravo de instrumento. Ação visando a anulação de deliberação condominial. Utilização do apartamento como hospedagem, por meio da plataforma eletrônica ‘Air BNB’. Impossibilidade. Edifício de caráter residencial. Liminar revogada. Recurso provido.” (TJSP; Agravo de Instrumento 2133212-93.2017.8.26.0000; Relator (a): Pedro Baccarat; Órgão Julgador: 36ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II – Santo Amaro – 14ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/09/2017; Data de Registro: 27/09/2017).”

“CONDOMÍNIO – LIMITAÇÕES À QUANTIDADE DE MORADORES POR UNIDADE CONDOMINIAL – LOCAÇÃO MULTIFAMILIAR – REPÚBLICA – RESCISÃO DE CONTRATO LOCATÍCIO – INDENIZAÇÃO – DANOS MATERIAIS, MORAIS E LUCROS CESSANTES – INEXISTÊNCIA DE CONDUTA ABUSIVA – DESCABIMENTO. Não é abusiva a decisão assemblear que, em virtude do elevado número de ocupantes (média de seis moradores por apartamento) da unidade condominial locada para habitação multifamiliar (república), bem como a alta rotatividade desses moradores, determina a redução para quatro no número de ocupantes em cada apartamento. Decisão que não impede o condômino de usar, fluir e livremente dispor de sua unidade condominial (CC, art. 1335), mas apenas limita o exercício desse direito, de forma a garantir a boa convivência e a segurança dos moradores, à medida que, é senso comum, numa cidade como São Paulo, que as constantes entradas e saídas de moradores temporários, dificulta o controle e fiscalização pelos funcionários do condomínio, acarretando insegurança ao condomínio como um todo. A decisão tomada pela maioria na assembléia condominial obriga a todos, quando não se mostre abusiva (CC, art. 1333). (TJSP; Apelação com Revisão 9226276-24.2006.8.26.0000; Relator (a): Clóvis Castelo; Órgão Julgador: 35ª Câmara do D. OITAVO Grupo (Ext. 2° TAC); Foro Central Cível – 30ª V. CÍVEL; Data do Julgamento: 07/05/2007; Data de Registro: 09/05/2007). ”

O jurista, professor, advogado e civilista Caio Mário da Silva Pereira assim lecionava:

“a convivência, a proximidade ou a circunstância de viverem os condôminos no mesmo prédio, pode-se dizer até na mesma casa, tomada esta palavra em sentido mais amplo, sujeita-os todos à observância de regras de comportamento mais rígidas
(…)
o dever de cumprimento daquelas disposições aprovadas pelos próprios condomínios na Convenção de Condomínio, as quais constituem lei particular do agrupamento dos integrantes deste, e estão sujeitas a estrita obediência.
(…)
Trata-se é bem verdade, de normas restritivas da liberdade individual, mas, da mesma forma que toda vida em sociedade impõe a cada um limitações à sua atuação livre em benefício do princípio social de convivência, assim também naquele pequeno agrupamento de pessoas, que compõem uma comunidade especial, adotando como normas convenientes à tranquilidade interna desta certas limitações à liberdade de cada um em proveito da melhor harmonia do todo.2

Ora, não se pode admitir o uso e fruição de algumas unidades por meio da AIRBNB, sem que se tenha o mínimo de controle para que sua colheita de frutos e rendimentos provenientes de sua propriedade não venha ferir os direitos de propriedade de terceiros e, quiçá, direitos fundamentais tão, ou até mais, importantes que aqueles suscitados pelos condôminos que utilizam a plataforma.

Pois bem, ainda com todos os argumentos que já eram manejados na defesa dos interesses condominiais, a questão ainda possui grande controvérsia nos Tribunais, onde são proferidas decisões conflitantes, ora respaldando todos os pontos acima citados, ora decidindo que os negócios operados por aplicativos de hospedagem eram contratos típicos de locação, em claro prejuízo para os condomínios.

Contudo, o entendimento deve convergir de forma mais sólida em favor dos condomínios que desejavam impedir o uso de aplicativos de locação de curta e curtíssima temporada, como o “AIRBNB” e seus assemelhados, por conta do recente julgamento de Recurso Especial no Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n º 1819075/RS, em caso em que se discutia exatamente a celeuma travada pelo uso da plataforma em condomínios residenciais.

Neste recente julgamento, por maioria dos votos, os ministros decidiram, naquele caso específico, pela impossibilidade de uso da plataforma “AIRBNB” no condomínio, tendo em vista a previsão em convenção de uso estritamente residencial das unidades autônomas, salvo no caso de os próprios condôminos alterarem a convenção para prever a possibilidade do uso da plataforma, de maneira expressa.

Em seu voto, o Ministro Raul Araujo menciona:

“Tem-se um contrato atípico de hospedagem, expressando uma nova modalidade, singela e inovadora, de hospedagem de pessoas sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas. ”
(…).
Assim, o direito do proprietário condômino de usar, gozar e dispor livremente do seu bem imóvel, nos termos dos artigos 1.228 e 1.335 do Código Civil de 2002 e 19 da Lei 4.591/1964, deve harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas propriedades abrangidas no condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em regime de condomínio edilício.

O velho caso do Airbnb em prédios residenciaisConforme pode se notar, o Colendo STJ ratifica o correto entendimento para a questão discutida nesta opinião legal, pendendo a balança em favor dos condomínios residenciais, que acabam se tornando verdadeiros reféns de proprietários despreocupados em respeitar o direito alheio.

Ao que tudo indica, o mesmo entendimento seguirá a 3ª Turma de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que na última terça feira iniciou o julgamento do Recurso Especial nº 1884483/PR.

O relator do caso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, destacou em seu voto a incompatibilidade da prática em condomínios residenciais, onde a vontade coletiva é a que deve prevalecer sobre os anseios individuais dos condôminos.

“Tem-se um contrato atípico de hospedagem, expressando uma nova modalidade, singela e inovadora, de hospedagem de pessoas sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas”
(…).
“A exploração econômica de unidades autônomas mediante locação em curto ou curtíssimo prazo, caracterizada pela eventualidade e transitoriedade, não se compatibiliza com a destinação exclusivamente residencial. É inegável a afetação do sossego, da salubridade e da segurança causada pela alta rotatividade de pessoas estranhas e sem compromisso duradouro com a comunidade na qual está, temporariamente, inserida”
(…).
“Sendo a destinação residencial prevista em convenção condominial requisito suficiente para obstar a prática em questão, torna-se inócua a discussão sobre a eventual existência de vícios na assembleia na qual foi aprovada a proposta de proibir a locação de unidades autônomas pelo prazo inferior a 90 dias”

Cabe aqui pontuar que o recurso acima citado ainda não foi julgado, ainda pendem os votos dos demais ministros, e segue com pedidos de vista realizados pelos ministros Moura Ribeiro e Marco Bellizze.

Embora nenhum dos julgamentos do STJ acima mencionados possuam repercussão geral, ainda assim, criam um grande e importante precedente para que os tribunais inferiores sigam a mesma linha de raciocínio nos julgamentos.

É importante reforçar dois conceitos sólidos, um, o respeito ao quanto disposto na convenção é ato obrigatório, inteligência do artigo 1.333, do Código Civil, e, dois, impera na vida em sociedade e no âmbito interno dos condomínios, a supremacia do interesse coletivo em detrimento do particular, pois é essa comunhão e respeito mútuo de direitos, deveres e interesses que possibilita uma convivência harmônica e saudável.

Deixo claro que a opinião aqui expressada fora tomada com base no que consta na Lei, na doutrina, na jurisprudência, e nos recentes precedentes dos julgamentos do STJ, que denotam que, felizmente e finalmente, estamos caminhando para a unificação do entendimento do judiciário sobre a incompatibilidade das locações de curtas e curtíssimas temporadas por meio de aplicativos de hospedagens em condomínios estritamente residenciais.

1 DE MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 34. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2017.
2 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e Incorporações. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015.

Cássio Conceição é advogado especializado em condomínios e sócio da Rachkorsky Advogados Associados

*Por Cássio Conceição

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