Condômino antissocial: como comprovar?
No caso de hoje que irei relatar por aqui, a minha atuação foi como jurídico consultivo, e assim fui procurada pelo corpo diretivo de um condomínio para uma consulta e realização de parecer jurídico sobre um condômino que cometia reiteradas condutas antissociais em um residencial na cidade de Itatiba interior de São Paulo.
Afinal, como o condomínio pode comprovar que aquele é um condômino antissocial?
Haviam dezenas de reclamações decorrentes de condôminos moradores nas unidades existentes naquele condomínio, em razão da produção excessiva de barulhos e ruídos de madrugada dentro da unidade, uso indevido da piscina utilizando-se de copos e garrafas de vidros o que era era terminantemente proibido pelo Regimento Interno, e muitas vezes eram quebrados durante a “bebedeira à beira da piscina” (conforme relatos no livro de ocorrências) e deixavam os cacos de vidros espalhados pela área da piscina, barulhos excessivos de instrumento tipo bateria até de madrugada, festas em sua unidade condominial durante a pandemia com “entra e sai” de dezenas de pessoas convidadas, entre várias outras reclamações, que já vinham sendo advertidas e multadas.
O corpo diretivo do condomínio recorreu a assesoria jurídica com o intuito de colher informações sobre as providências que poderiam ser adotadas em face deste morador e também condômino que adotava condutas antissociais e que, de forma reiterada, estava tumultuando o convívio no condomínio.
Inicialmente, preciso relembrá-los que o Código Civil, no Artigo 1.336, inciso IV, determina que os condôminos têm o dever de utilizar suas partes de forma a não prejudicar o sossego, a salubridade e a segurança dos demais possuidores, também sendo necessário utilizá-las de acordo com sua destinação, vejamos:
“Art. 1.336 – São deveres do condômino:
[…] IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.”
A simples leitura do artigo 1336, inc.IV, já é suficiente para deixar claro que o fato do condômino ter o direito exclusivo de usar e fruir do seu apartamento não significa que pode agir como bem entender, sem se preocupar com os demais condôminos. Assim, não cumprindo tais deveres poderá o síndico, independentemente da deliberação em assembleia, aplicar multa prevista na convenção do condomínio. O §2º é caso a referida multa não esteja prevista na convenção do condomínio.
O comportamento antissocial pode existir de várias formas, mas em alguns casos estará sujeito à penalidade do artigo 1.336,§2º, do Código Civil.
Ainda, o Código Civil esclarece que:
“Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.”
Tendo em vista os recorrentes fatos e a conduta antissocial registrada por parte de um condômino em especial daquele residencial, é importante destacar que o art. 42 da Lei de Contravenções Penais é claro:
“Art. 42. Perturbar alguem o trabalho ou o sossego alheios:
I – com gritaria ou algazarra;
II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;
III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;
IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda:
Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.”
O Código Civil ainda estabalece que podem ser aplicadas sanções e multas em casos onde reiteradamente a conduta antissocial está sendo mantida:
“Art. 1.337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.
Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.”
Então em resumo, os artigos 1336 e 1337 do Código Civil veiculam um crescente de multas pecuniárias que podem ser aplicadas a esses infratores, tendo como ponto principal que devemos considerar como ponto de partida as multas previstas na própria Convenção (artigo 1.336, § 2°).
Em casos de moradores antissociais as multas costumam ser severas, porque já se tomaram várias providências com notificações, e, teoricamente, elas não foram atendidas, sempre seguindo a Convenção e o Código Civil.
Se a multa comum não funcionar, é possível fazer uma convocação de assembleia para multar a unidade em até 10 vezes o valor da taxa condominial. Para isso existe o art. 1.337, parágrafo único que foi mencionado já em parágrafo anterior.
Preciso aqui mencionar, relembrando a todos que, as garantias constitucionais também devem incidir nas relações condominiais, devendo ser assegurados, a ampla defesa e o contraditório, sempre que possível.
O que temos visto em casos atuais, é que geralmente o Poder Judiciário determina o afastamento do condômino antissocial daquele ambiente condominial para que assim se evitem tragédias, pois tais condutas geralmente são nocivas e eivadas de discussões, gritarias, agressões físicas e verbais muito sérias.
Necessário destacar que a atuação do condomínio na resolução das questões internas, especialmente em razão de condutas dos condôminos nas dependências comuns limita-se ao elencado no Código Civil, na Convenção Condominial e no Regulamento Interno, sendo-lhe vedada a interferência em assuntos e situações que envolvam direito particular e/ou solicitações que não possuam relação com a coletividade, considerando que a natureza do Condomínio é de propriedade comum a todos os condôminos.
Neste sentido, salientei em parecer que, para que ocorresse o enquadramento de qualquer condômino como antissocial, é necessário que as condutas infratoras sejam devidamente registradas e que haja histórico de penalidades em face da unidade, sendo certo que, em observância ao disposto no artigo 1.337 do Código Civil, o tema deve ser levado à assembleia para aplicação de multa correspondente ao quíntuplo do valor atribuído à cota condominial ou ao décuplo deste importe.
O Código Civil não dispõe sobre a expulsão do condômino antissocial, por isso, os casos costumam parar na justiça, e então o Poder Judiciário pode acatar o pedido extremo de expulsão do condômino antissocial e intolerável para viver em comunidade em respeito à coletividade.
Mas é importante destacar, que para levar um caso desses a justiça, não basta somente que o morador seja importuno ou mal visto pela grande maioria, é necessário que sua infração seja grave, contínua, repetida e que seja acima de tudo provada, caso contrário, ao final, o entendimento do Juiz pode ser pela não expulsão do mesmo por violar o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à propriedade.
Por Amanda Accioli
Condômino antissocial: como comprovar?